Nome da Disciplina: Tópicos Especiais em Sociologia V – Natureza e Colonialismo

Professor: André Dumans Guedes

Linha de Pesquisa: Estados, Mercados e Conflitos

Código da Disciplina: EGH10505

Ano/Semestre: 2023/1

Dia e horário: Quarta-feira, 10-13

Local: Sala 307 bloco O

Ementa:

O tema central desse curso é a oposição entre natureza e cultura. Como sabemos, essa oposição  funciona, no moderno Ocidente capitalista, através da pressuposição de que há diferenças fundamentais entre o que existe em cada um destes dois domínios. Um “grande divisor” operaria então a partilha e a manutenção dessas diferenças, separando aquilo que cabe aos assuntos humanos (na cultura, na sociedade, na história, nos reinos da razão e dos sujeitos etc.) daquele imenso resto que residiria do outro lado dessa fronteira. Tendo um papel estruturante na constituição de valores, visões de mundo, práticas sociais e instituições, essa oposição e esse divisor erigem também o arcabouço de disciplinas como a sociologia e a antropologia – um ponto que nos interessa particularmente, visto que será justamente junto a essas disciplinas que iremos buscar ferramentas intelectuais para levar adiante nossas discussões.

No curso, essas questões aparecerão aquecidas e transformadas pelas urgências impressas pelo que, grosso modo, conhecemos como “a questão ambiental”. Uma série de eventos recentes – as mudanças climáticas, a epidemia de COVID-19, as devastações operadas por monoculturas e extrativismos, as reconfigurações das lutas políticas indígenas – oferece assim uma ótima oportunidade para refletirmos a respeito do lugar da “natureza” ou do “ambiente” no repertório conceitual e analítico das ciências sociais.

Assim, são dois os movimentos teóricos que organizam o curso:

1) Em um primeiro momento, recorreremos a certas discussões sociológicas clássicas para pensarmos o papel desse grande divisor na constituição do mundo moderno, concedendo atenção sobretudo ao modo como tal oposição organizou e classificou saberes (as ciências naturais e sociais, os reinos do não-científico) e se imbricou a formas específicas de dominação (o que chamamos aqui de “colonialismo”).

2) Na segunda metade do curso, dedicaremos nossa atenção a certa literatura antropológica contemporânea que busca descrever e contextualizar historicamente o trabalho político e epistemológico desse projeto de repartição e divisão do mundo. Essa literatura indica caminhos para a realização de investigações capazes de criar espaço e protagonismo para aqueles povos, seres, coletivos, formas de vida e modos de existência que, frequentemente subsumidos no domínio do “natural”, não foram propriamente acolhidos e representados nas tradições hegemônicas do pensamento ocidental.

Formas de Avaliação: trabalho final por escrito

Planejamento das aulas:

SESSÃO 1: Apresentação do curso, dos professores e dos alunos

SESSÃO 2: Um ou dois problemas quentes: Antropoceno e (e/ou?) conflitos socioambientais

KOPENAWA, Davi e ALBERT, Bruce. Capítulo 13, “O tempo da estrada” (p. 291-310); Capítulo 15, “Comedores de terra”; Capítulo 16, “O ouro canibal” (p. 334-372). A Queda do Céu. Palavras de um Xamã Yanomami. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.

CHAKRABARTY, Dipesh. “O clima da história: quatro teses”. Critical Inquiry, 35 (2009), Sopro 91, julho de 2013.

Complementar:

NOGUEIRA, Mônica. Gerais a Dentro e a Fora: Identidade e Territorialidade entre Geraizeiros no Norte de Minas Gerais. Tese de Doutorado. Departamento de Antropologia da Universidade Federal de Brasília, 2009. Capítulo 4, “O tempo do encurralamento” (p. 134-165).

HARAWAY, Donna; TSING, Anna; MITTMAN, Gregg. Reflections on the Plantationocene. A conversation with Donna Haraway and Anna Tsing moderated by Gregg Mittman. Madison: Edge Effects Magazine, June 18, 2019.

SESSÃO 3: A constituição do cosmos moderno

PRIGOGINE, Ilya e STENGERS, Isabelle. Capítulo 1, “O projeto da ciência moderna” (p. 19-41). A Nova Aliança. Metamorfose da Ciência. Brasília: Editora da UnB, 1984.

KOYRÉ, Alexander. “Apresentação” (p. V-XIII), “Prefácio” e “Introdução” (p. 1-7); Capítulo IV, “Coisas que ninguém nunca viu antes e pensamentos que ninguém teve: a descoberta de novos astros no espaço físico e a materialização [sic] do espaço: Galileu e Descartes” (p. 80-91). Do Mundo Fechado ao Universo Infinito. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1971.

Complementar:

SHAPIN, Steven. Capítulo 1, “What was known?” (p. 15-46; itens “The scope of knowledge and the nature of nature”; “The challenge to a human-centered universe”; “The natural machine”). The Scientific Revolution. Chicago and London: The University of Chicago Press, 1996.

SESSÃO 4: Iluminismo e Romantismo, física e biologia, ciências naturais e ciências sociais 

DIAS DUARTE, Luiz Fernando. “A pulsão romântica e as ciências sociais no Ocidente”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 19, n. 55. 

Complementar:

PRIGOGINE, Ilya e STENGERS, Isabelle. “Capítulo 3: As duas culturas”. A Nova Aliança. Metamorfose da Ciência. Brasília: Editora da UnB, 1984.

SESSÃO 5: Algumas coordenadas clássicas (I): Natureza (humana) e o problema do simbolismo em Durkheim

DURKHEIM, Émile. “O dualismo da natureza humana e suas condições sociais”. Essencial Sociologia / organização e introdução de André Botelho. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2013.

Complementar:

CASSIRER, Ernst. Ensaio sobre o Homem. Introdução a uma Filosofia da Cultura Humana. Capítulo 1, “Crise no conhecimento do homem sobre si mesmo”; Capítulo 2, “Uma pista para a natureza humana: o símbolo”; Capítulo 3, “Da reação animal à resposta humana” (p. 15-61). São Paulo: Martins Fontes, 1994.

SESSÃO 6: Algumas coordenadas clássicas (II): Weber e o desencantamento do mundo

WEBER, Max. “Ciência como vocação”. Essencial Sociologia / organização e introdução de André Botelho. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2013.

Complementar:

PIERUCCI, Antônio Flávio. “Capítulo 9: Passo 4 – A religião da China”. O Desencantamento do Mundo: Todos os Passos do Conceito em Max Weber. São Paulo: Editora 34, 2013.

SESSÃO 7: Algumas coordenadas clássicas (III): trabalho, tecnologia e dominação social da natureza

ADORNO, Theodor e HORKHEIMER, Max. “O conceito de esclarecimento” (p. 19-39; atenção: é só este trecho do artigo, até antes do parágrafo que começa com ‘No mundo esclarecido, a mitologia invadiu a esfera profana’).  In: Dialética do Esclarecimento. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985.

OLIVEIRA, Bernardo Jefferson de. Capítulo VIII, “A transformação da natureza” (p. 125-140).  Francis Bacon e a Fundamentação da Ciência como Tecnologia. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2002.

Complementar:

BENHABIB, Seyla. Capítulo 6, “Autonomy as mimetic reconciliation” (p. 186-223). Critique, Norm and Utopia. A Study on the Foundations of Critical Theory. New York: Columbia University Press, 1986.

HORKHEIMER, Max. Eclipse da Razão. Capítulo 3, “A revolta da natureza” (p. 97-132). São Paulo: Centauro Editora, 2010.

SESSÃO 8: Os “verdadeiros” humanos, os seres racionais e as outras criaturas

THOMAS, Keith. Capítulo 1, “O predomínio humano” (pp. 21-60). O Homem e o Mundo Natural. Mudanças de Atitudes com Relação às Plantas e aos Animais. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

Complementar:

DESCOLA, Philippe. Além de natureza e cultura. Tessituras, Pelotas, v. 3, n. 1, p. 7-33, jan./jun. 2015.

SESSÃO 9: Ciência moderna, viagens e expedições

PRATT, Mary Louise. Imperial Eyes. Travel Writing and Transculturation. Capítulo 2, “Science, planetary consciousness, interiors” (p. 15-37). London and New York: Routledge, 1992. (existe versão em português)

Complementar:

LIMA, Nísia Trindade de. Capítulo 3, “Missões ao interior e interpretação do Brasil”. Um Sertão Chamado Brasil. Rio de Janeiro: Revan/Iuperj, 1999.

LATOUR, Bruno. Capítulo 6, “Centros de cálculo” (“Prólogo” e “Parte A”, p. 349-377). Ciência em Movimento. Como Seguir Cientistas e Engenheiros Sociedade Afora. São Paulo: Unesp. 2000.

SESSÃO 10: Problematizando o divisor natureza/cultura (1): ciborgues e tentáculos

HARAWAY, Donna. “Manifesto ciborgue. Ciência, tecnologia e feminismo-socialista no final do século XX” (p. 33-117). Antropologia do Ciborgue: as Vertigens do Pós-humano. Belo Horizonte: Autêntica, 2013

Complementar:

HARAWAY, Donna. Capítulo 2, “Tentacular thinking: Anthropocene, Capitalocene, Chthulucene” (p. 30-57). Staying with the Trouble. Making Kin in the Chthulecene. Durhan and London: Duke University Press, 2016.

INGOLD, Tim. “Octopuses and anemones”. The Life of Lines. Routledge, 2015

SESSÃO 11 e SESSÃO 12: Problematizando o divisor natureza/cultura (2): as ciências (no plural e em minúsculas) contra a Ciência e contra o Simbolismo

LATOUR, Bruno. Capítulo 2, “Circulating Reference. Sampling the Soil in the Amazon Forest” (p. 24-78). Pandora’s Hope. Essays on the Reality of Science Studies. Cambridge and London: Harvard University Press, 1999. (existe versão em português)

Complementar:

LATOUR, Bruno. Capítulo 2, “Constituição” (p. 19-52); Capítulo 3, “Revolução” (p. 53-89). Jamais Fomos Modernos. São Paulo: Editora 34, 1994.

SESSÃO 13: Redes, Técnicas e Redes Sociotécnicas (dois estudos empíricos exemplares)

SAUTCHUK, Carlos. Capítulo 3, “Costa – horário, serviço e engajamento técnico” (p. 147-200). O Anzol e a Corda. Técnica e Pessoa na Amazônia.Brasília: Editora da UnB, 2020.

Complementar:

SILVEIRA, Diego Soares da. Capítulo 1, “Bioprospecção de plantas medicinais amazônicas e a produção de fitoterápicos: farmacognosia, rede e ontologia” (p. 41-75); Capítulo 3, “Habitus ribeirinho, redes comunitária e plantas medicinais” (p. 114-151)

SESSÃO 14: As possibilidades de vida nas ruínas do capitalismo

TSING, Anna. Capítulos “Enabling entanglements”, “Prologue”, “Arts of noticing”; “Contamination as collaboration” (p. VII – 34). The Mushrooms at the End of the World. On the Possibility of Life in Capitalist Ruins. Princeton University Press, 2015.

Complementar:

TSING, Anna. Viver nas Ruínas: Paisagens Multiespécies no Antropoceno (textos a selecionar) Brasília: IEB Mil Folhas, 2019.

SESSÃO 15: As linhas e vidas de Tim Ingold

INGOLD, Tim. “Trazendo as coisas de volta à vida. Emaranhados criativos num mundo de materiais”. Horizontes antropológicos. Porto Alegre, ano 18, n. 37, p. 25-44, jan./jun. 2012.

VELHO, Otávio. “De Bateson a Ingold: passos na constituição de um paradigma ecológico”. Mana 7(2): 133-140, 2001.

Complementar:

INGOLD, Tim. “Line and blob” e “Octopuses and anemones”. The Life of Lines. Routledge, 2015.

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